Justiça suspende cota que limita ocupação de cinemas pelo mesmo filme

FOLHA DE SÃO PAULO

Vigente desde 2015, acordo impedia ‘lançamentos predatórios’ de blockbusters

Guilherme Genestreti

27.nov.2018 às 13h08 – São Paulo

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região suspendeu a cota que limitava em 30% o número de salas de cinema que poderiam exibir um mesmo filme.

A diretoria da Ancine (Agência Nacional do Cinema) se reuniu nesta terça (27) e informou que irá recorrer da decisão “para que sejam mantidas as estratégias de política pública do setor sempre em respeito aos postulados constitucionais e legais”, segundo nota.

Até lá, contudo, novos lançamentos não precisam mais respeitar a regra. Isso significa que blockbusters do fim do ano, como “Aquaman” e “O Retorno de Mary Poppins” podem estrear em número massivo de telas.

A cota suspensa, vigente desde 2015, era resultado de um acordo entre Ancine e agentes do mercado e visava impedir que cadeias cinematográficas promovessem o chamado “lançamento predatório”, isto é, fizessem com que um único título ocupasse várias salas de um mesmo complexo e sufocasse a diversidade da programação.

À época, o pacto foi antecipado pela Folha e decorria de controvérsia cercando a chegada de blockbusters. No fim de 2014, o longa “Jogos Vorazes: A Esperança–Parte 1” bateu um recorde e estreou em 1.300 salas das então 2.800 do país (46% do total), gerando polêmica no setor. A medida pactuada com a Ancine foi tomada para conter casos como esse.

Em seu voto como relator, o desembargador Johonsom di Salvo afirma que a cota configura “severa intervenção em atividade negocial lícita” e que, como a atividade cinematográfica “não tem natureza de serviço público”, ela “só pode receber do poder público uma tutela mínima”.

Di Salvo foi favorável a uma apelação interposta pelo Sindicato das Empresas Exibidoras Cinematográficas de São Paulo, que ingressou na Justiça contra a medida implementada pela Ancine.

Seu voto pode abrir discussão em torno de outra cota, a chamada cota de tela, que estipula um número mínimo de dias que os cinemas do país são obrigados a exibir filmes nacionais. O tema é debatido no Supremo Tribunal Federal;

Regulada por uma medida provisória de 2001 e válida por 20 anos, ela determina uma multa de 5% sobre a receita bruta média diária da sala para cada dia que ela descumprir essa estipulação.

Sempre no mês de dezembro um decreto é publicado discriminando o número de dias da cota de tela que terão de ser observados no ano seguinte.

Produtores do país temem que a decisão do TRF abra brecha para que essa medida seja extinta, ainda mais se o próximo governo vir mesmo a adotar uma visão ultraliberal na economia e suspender esse tipo de mecanismo de proteção à indústria brasileira.

O desembargador Di Salvo não poupou farpas e afirmou em seu voto que a qualidade do cinema nacional “é bastante irregular”.