PL que regula VOD é criticado por maioria dos convidados à audiência pública na CAE
Marcos Urupá
Tela Viva
A Comissão de Assunto Econômicos (CAE) do Senado realizou nesta segunda-feira, 7, audiência pública para discutir aspectos regulatórios do vídeo sob demanda (VOD) que constam no PLS 57/2018, de autoria do senador Humberto Costa (PT-PE). Ainda faltaram convidados a serem ouvidos e uma segunda audiência será marcada, ainda em outubro, conforme anunciou o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), relator da proposta. Os debates giraram em torno dois aspectos do projeto: a tributação e a cota de tela. Mas também se ouviu das falas dos palestrantes críticas à gestão da Ancine e sugestão de inocuidade do projeto de lei.
O projeto de lei coloca a incidência da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) para os provedores do serviços de vídeo sob demanda e para os responsáveis pelas plataformas de compartilhamento de conteúdos. O texto propõe que o valor de contribuição a ser pago pela empresa tenha como parâmetro a sua receita bruta anual, e a depender do montante da receita, progressivamente pode chegar em até 4% de incidência. Já para a cota de tela para a produção nacional nesses serviços, o PLS propõe que esta não pode ser inferior a 20% do total de horas do catálogo ofertado pelo provedor do serviço.
A proposta do projeto de lei foi bastante criticada pela maioria dos debatedores. A voz destoante veio de Rojer Garrido, presidente do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC) e diretor da Associação de Produtoras Brasileiras de Audiovisual do Centro Oeste /APBA-CO, que defendeu a regulamentação apresentada no projeto para a cobrança da Condecine e para a política de cotas. “No passado, imaginava-se que a implementação das cotas acabaria com o cinema. E vimos o contrário. O negócio funcionou muito bem. A cota é uma forma de disponibilização ao consumidor daquele conteúdo. É só um carregamento. Temos que ter conteúdo nacional nesse serviço”, disse. Sobre a forma de incidência do Condecine que o texto do senador Humberto Costa propõe, Garrido disse que a incidência por faturamento é a melhor estratégia. Para ele, o setor tem uma visão de preocupação nesse debate. “Se o audiovisual não for contemplado neste debate, acabaremos com o que foi conquistado até aqui”, disse Garrido.
Marcos Bitelli, Advogado da Associação Brasileira de Programadoras de TV por assinatura (ABPTA) disse que o projeto foi feito olhando para o retrovisor. “O PLS 57/2018 olha o mundo a partir de uma premissa copiando a regulação do cinema. Nesse modelo, há a escassez de tela. Na conjuntura atual, com múltiplas telas, essa escassez não existe”, disso. Bitelli também enxerga que o projeto, caso seja aprovado do jeito que está, pode trazer para a Ancine responsabilidades que ela pode não dar conta. “Vemos nesse projeto uma reprodução do erro: colocar obrigações regulatórias que a Ancine pode não dar conta. Hoje, ela já não consegue, por exemplo, depurar as milhares de informações que meus associados enviam para a agência mensalmente. O projeto coloca responsabilidades para a Ancine de uma forma que ela não consiga acompanhar”, destacou. O advogado também pontuou que o VOD já é tributado e por isso disse que tributar um mercado que ainda está em processo de desenvolvimento pode trazer um problema futuro.
O desenvolvimento do mercado foi também um elemento apontado por Cristiano Flores, Diretor-geral da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). “Na nossa avaliação, o mercado de VOD no Brasil é prematuro. E nos parece que um PL desta magnitude não se mostra adequado pois traz uma série de elementos que o mercado de VOD não comporta”, disse. Flores também destacou que os debates que estão sendo feitos no Conselho Superior do Cinema sobre tributação tornariam a proposta apresentada no projeto de lei já superada.
Na mesma linha foi o representante da Motion Picture Association of America (MPA), José Maurício Fittipaldi. “O serviço de VOD é um serviço nascente no Brasil. Todas as modalidades de receita por todas as prestadoras do serviço de VOD representam 5% da receita do audiovisual no Brasil”, disse. Fittipaldi também falou que regular este mercado que ainda está em formação pode criar entraves para a entrada de novos atores, já que algumas das maiores empresas de conteúdo do mundo ainda não lançaram seus serviços de VOD. Na opinião dele, o projeto é extremamente intervencionista.
O representante do governo, o secretário do Audiovisual Secretaria Especial da Cultura Ministério da Cidadania, Ricardo Rihan, disse que a Ancine hoje não consegue operar de maneira eficiente dentro do tamanho que o mercado se tornou e defendeu uma simetria tributária, pois as grandes empresas de VOD devem também fazer sua contribuição para o país.
Paula Pinha, Diretora de Relações Governamentais e Políticas Públicas da Netflix, uma das empresas que é objeto do PLS 57/2018, explicou que a plataforma começou a produzir conteúdos originais no Brasil em 2016, e hoje já tem mais de 30 filmes originais na plataforma. “Os conteúdos brasileiros produzidos pela Netflix circulam em todos os 190 países onde a empresa está”, disse. Pinha disse que a empresa apoia a regulação do serviço de VOD, mas que seja de uma maneira equilibrada. Ela ponderou sobre as cotas, dizendo que as obrigar no VOD poderia prejudicar o conteúdo.