PayTV Forum começa a discutir mudanças na TV por assinatura brasileira; entenda
Edianez Parente
BOL - Observatório da Televisão
A crise econômica afetou o bolso do cliente, mas as operadoras e os canais de TV paga estão em momento de DR – “discutir a relação” – para garantir a permanência do assinante no serviço. Com uma parte do público já tendo cancelado sua assinatura por não conseguir mais pagar e outra parte cada vez mais interessada em conectividade, mobilidade e comodidade para assistir ao que quiser na hora e forma que bem entender, a TV por assinatura no modelo como a conhecemos está em debate.
Como se não bastasse, há ainda uma questão que virou caso de Justiça, sobre a venda de canais pagos na internet feita pelas próprias programadoras sem intermediação de uma empresa operadora (como Net, Claro, Vivo etc). Os temas foram o assunto dominante na terça-feira, 30, primeiro dia do PayTV Forum 2019, encontro profissional do mercado de TV paga que reúne no centro de convenções WTC em São Paulo executivos das principais empresas do setor.
As conversas começaram com um painel onde foram apresentados por consultores dados da economia nacional, ao lado de perspectivas no cenário da tecnologia e transformação por que passa o setor. As conclusões não são exatamente uma novidade: que a crise econômica vem afetando o setor, com a queda de poder aquisitivo, aumento dos índices de desemprego e consequente cancelamento de assinaturas.
Futuro da televisão
Para a economia como um todo, é esperada uma recuperação da atividade nos próximos anos. Mas para a TV por assinatura, que já teve 20 milhões de domicílios assinantes do país e atualmente está abaixo dos 17 milhões (dados de maio, da Anatel), há mais questões para se levar em conta, além do cenário econômico do país. O consultor Omarson Costa, que já trabalhou em empresas como Telefônica e ajudou a implantar a Netflix na América Latina, disse que a TV virou software e o modelo digital por aplicativos é o futuro da televisão.
O grupo Claro Brasil – operadora de TV a cabo Net e Claro TV (operação de DTH, que são as miniparabólicas tipo pizza) – é a líder do mercado brasileiro, com 8,2 milhões de clientes de TV paga (dados da Anatel, referentes a maio último). O seu vice-presidente de estratégia, Rodrigo Marques, não acredita que o problema atual seja da televisão em si, mas sim da conjuntura econômica. Ele lembra que a classe C foi muito impactada com a crise, e por isso houve uma grande perda de clientes das miniparabólicas. E admite que a TV por assinatura no Brasil é cara.
“Tem uma quantidade de impostos sem precedentes, impostos federais e estaduais. As pessoas querem ter TV por assinatura, mas não têm capacidade de pagar”, assinala. Em outro momento de sinceridade, o executivo admitiu também que existe, sim, um problema nos pacotes, que são muito “amarrados”. Vale lembrar que essa é uma queixa antiga dos assinantes, que sempre pediram para pagar apenas por canais de interesse , mas a indústria sempre justificou haver dificuldade de flexibilização. “Tem de ajustar os modelos para as novas demandas do mercado”, reconheceu Marques.
Fôlego para o DTH
Pela Sky (operadora com cerca de 5 milhões de clientes), o VP de Vendas Sérgio Ribeiro diz que há muitos anos ouve a história de que o DTH vai acabar. Para ele, não só não vai acabar como a TV por assinatura captada por satélite pode ganhar mais fôlego ainda, haja vista que há ainda 20 milhões de residências que captam TV aberta gratuita via banda C (a antena parabólica grande), 17 milhões ainda em sinal analógico.
Para ele, tão logo haja melhora no cenário econômico, até a pirataria que tende a diminuir. “Sabemos que o público quer assistir em vários dispositivos”, afirma, complementando que a “a Sky oferece o Skyplay para dispositivos móveis, mas também acredita muito no aparelho de TV como ‘device’. As pessoas querem cada vez telas maiores, na sala”, disse.
Da Vivo TV, a diretora de Experiência do Cliente Maria Claudia Ornelas diz que o que importa é: a experiência com o cliente. “O que a gente vê é que o cliente quer uma experiência com a melhor qualidade. Expansão da rede de fibra, 4G, o cliente quer uma variedade de conteúdo de qualidade”.
Ela também destaca que o cliente quer variedade de acesso e de conteúdo e por isso a operadora tem se dedicado a parcerias, como as que foram feitas com a NBA (basquete), por exemplo, e NFL. A operadora também incluiu a Netflix no seu cardápio. Segundo Maria Claudia, a Vivo se posiciona como “hub” de conteúdo e tem a mobilidade inserida em todo o seu contexto; por isso tem levado o VivoPlay para as SmarTVs, numa estratégia de oferta integrada fixo-móvel.
Na justiça
Em outro debate, o tema da venda de canais pela internet foi embalada pelo caso envolvendo o serviço Fox+. A oferta feita de forma digital sem passar por nenhuma operadora (como Net, Sky, VivoTV etc) tinha sido alvo de medida cautelar da Anatel, que suspendeu a venda. Mas a Justiça já liberou a comercialização do serviço. Trata-se de uma questão que tem legislação aprovada pelo Congresso Nacional desde 2011, com a Lei do Serviço de Acesso Condicionado (SeAC), a 12.485/11.
Mas como toda lei, ela está sujeita a interpretações e, na opinião de alguns executivos do mercado, o texto necessita de atualização por conta da inovação tecnológica. Para outros, não há nada de novo no cenário, com as mesmas tecnologias de 2011 sendo utilizadas hoje. Essa é apenas uma das controvérsias.
O superintendente de Competição da Anatel, Abraão Balbino, afirmou que o imbróglio pode se arrastar na Justiça por muitos anos caso não seja revista a legislação. A Claro foi a operadora que fez a denúncia, que envolvia além da Fox também a programadora de canais Turner.
De forma resumida, para entender o caso: a lei obriga as operadoras que vendem canais de TV por assinatura a cumprirem uma série de obrigações, como incluir emissoras públicas (TV Câmara, TV Senado, TV Justiça etc), há pagamento de impostos e uma série de compromissos sobre cotas de canais de programação com conteúdo nacional. A oferta direta na internet de canais por assinatura não exige essas obrigações e as operadoras se sentem prejudicadas diante desta competição.
Opinião da Abert e Abratel
Abert e Abratel, entidades que representam os radiodifusores (canais da TV aberta, como Globo, SBT, Record), estão do mesmo lado que a Fox nessa questão. O advogado das entidades, Caio Mário Pereira Neto, afirma que as ofertas não estão ligadas a nenhuma estrutura de telecomunicação, portanto não podem se enquadrar na lei do SeAC.
Marcos Bitelli, advogado da TAP (Television Association of Programmers – associação de programadoras americanas) e da MPA (Motion Pictures Association), ambas no Brasil, defende que haja mudança na lei.
Julio Worcman e Luis Antonio Silveira, respectivamente, representante do Curta!, canal independente brasileiro, e da Brasil Audiovisual Independente (Bravi), dependem tanto de operadoras quanto de canais para sobrevivência de seus negócios. Para eles, qualquer modificação na lei não pode prejudicar a presença dos conteúdos nacionais na TV por assinatura, muito impulsionada desde a lei 12.485.