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Gustavo Fioratti

Revista da Folha

Designer monta vídeo caseiro de Show para postar na Web.  Especialista diz que material viola Direitos Autorais

Durante o show do Radiohead na Chácara do Jockey, no mês passado, o designer gráfico Andrews Guedes, 22, ficou bem de frente para o palco. Mas os vídeos que ele exibe em blog criado especialmente para relembrar a ocasião (radioheadraindown.blogspot.com) mostram a apresentação à direita do palco, depois à esquerda, de perto, de longe… Há uma variedade de ângulos digna de jogos da Copa do Mundo.

Segredo nenhum. Essa mobilidade que apreende diferentes pontos de vista da platéia foi montada a partir de uma colaboração espontânea: depois de abrir o blog, cerca de cem pessoas, segundo ele, que estavam entre os 30 mil presentes no show enviaram vídeos captados por celulares e câmeras. Algumas imagens o rapaz também conseguiu no YouTube. A intenção é fazer um registro completo do show, música por música.

Sua obra “não-autorizada” vai, portanto, competir com a gravação oficial, do Multishow. O canal pago só levou ao ar 70 minutos das 2h em que o grupo tocou -parte do registro será reexibido no próximo dia 15, às 21h15, pela última vez, conforme contrato. Nem a produtora do evento nem o canal pago Multishow quiseram se manifestar sobre o conteúdo do blog.

A assessoria de imprensa do evento apenas relembra o que dizia o site do show: “a banda pede para que não sejam usadas câmeras ou flashes”. Segundo o advogado Marcos Bitelli, especialista em direito da comunicação, o site de Andrews viola o direito de imagem de quem, eventualmente, aparece em algum vídeo, além, claro, dos direitos autorais da banda.

Para se defender, o designer gráfico alega que os vídeos são disponibilizados gratuitamente para download. Sem “recompensa” financeira, jura ele. A possibilidade de rever aquele que considera o melhor show de sua vida e o parabéns dado pelo seu chefe, no trabalho, depois de citação no programa “Metrópolis” da TV Cultura, fazem valer as três horas gastas, por dia, para completar seu primeiro “site de sucesso”. “Nunca recebi tanto retorno”, gaba-se.

Androides e o velho PC
O morador de Itaquera (zona leste de SP), que gastou 70% de seu salário para comprar o ingresso de R$ 200, já disponibilizou cinco vídeos no blog, cada um com uma canção.

A edição é caseira, feita em um velho PC que ele tem em seu quarto. Uma música chega a ter mais de cinco tomadas diferentes, e o melhor registro de áudio permanece sincronizado a elas.

Está lá, entre os vídeos, um dos momentos de maior comoção do show, quando a plateia continua a cantar uma estrofe da música “Paranoid Android” mesmo depois de encerrada a canção. O vocalista Thom Yorke volta empunhando a guitarra para acompanhar o coro. “Rain down”/”Rain down”. A propósito: foi esse trecho que deu nome ao site.

Outras ações parecidas precedem o projeto do site “Rain Down”. Em 2004, os Beastie Boys distribuíram câmeras para várias pessoas em um show em Nova York. Depois, editaram as imagens no DVD “Awesome; I Fuckin’ Shot That!”. Até a banda brasiliense Capital Inicial entrou na onda e produziu um clipe a partir de câmeras do público.

A matéria-prima está lá na web, com milhares de vídeos de shows ao redor do mundo. Quem não quiser rever Radiohead só em São Paulo pode passear por apresentações da banda em Berlim, Nova York, Buenos Aires e Paris, por exemplo. Um registro sem precedentes. E um show que entra para a memória, também virtual, de uma cidade.