Os desafios da infraestrutura, digitalização e a burocracia

Marcos Alberto Sant Anna Bitelli

Revista Exibidor São Paulo: Tonks, pág. 26

Certamente, um dos maiores desafios para o país em todos os setores da economia é aperfeiçoar a infraestrutura para permitir o tão esperado crescimento econômico com sustentabilidade.

Certamente, um dos maiores desafios para o país em todos os setores da economia é aperfeiçoar a infraestrutura para permitir o tão esperado crescimento econômico com sustentabilidade. O Brasil já foi a bola da vez muito recentemente, e o que se ouve agora é que a bola está passando (ou passou) pela frente do gol e ninguém colocou o pé para balançar as redes. Trazendo esta constatação para o campo da exibição, enxergamos o mesmo cenário. A digitalização dos cinemas e a construção de novos complexos cinematográficos são fatos desejados por todos. E, neste ponto, até mesmo há apoio mais que explícito da ANCINE. Contudo, esse movimento no sentido de se fomentar o aumento e modernização da infraestrutura cinematográfica já entra praticamente no seu 4º ano calendário, sem grandes avanços. O programa Cinema Perto de Você foi pensado a partir de 2010, sendo efetivamente criado pela Medida Provisória 545 de 29 de setembro de 2011. Essa MP foi convertida em Lei em março de 2012. Sucedendo à Lei 12.599/2012, houve a necessidade de um Decreto (7.729 de maio de 2012) regulamentador e, em seguida, Portarias da ANCINE e da Receita Federal. Em junho de 2012, a ANCINE publicou a Instrução Normativa 103 regulando os procedimentos de análise e credenciamento dos projetos visando à habilitação para o Recine, perna essencial para os investimentos na infraestrutura, o que inclui a importação de equipamento. Em setembro de 2012, a Receita Federal editou a Instrução Normativa RFB 1294 que estabelece os procedimentos para habilitação ao Recine. Deste modo, o interessado na desoneração fiscal deverá passar por dois crivos. O primeiro da ANCINE, demonstrando que “cumpre com as suas obrigações perante a agência”. Como a norma não é clara, e, portanto, bastante ampla, levou algum tempo para que se pudesse afinar e fazer as aprovações com a ANCINE. Todavia, se a empresa estiver com todos os detalhes regulatórios cumpridos, a aprovação não é das mais demoradas, considerando outros órgãos das administrações públicas. A aprovação da Receita Federal, segundo a INRFB para a obtenção do Ato Declaratório Executivo (ADE) é de competência do Delegado da Receita Federal ou do Derat (Delegacia Especial da Receita Federal do Brasil de Administração Tributária) verificar a regularidade fiscal da pessoa jurídica requerente em relação aos impostos e às contribuições administrados pela RFB. Estas informações, na Receita Federal são as mais básicas, ou seja, basta a autoridade fiscal tirar o extrato de eventuais débitos do interessado, e, se nada constar, expedir o ato. A competência para análise pela Receita Federal dessa segunda fase do processo é territorial, o que significa que cada empresa deverá fazer a solicitação do Ato Declaratório no local da sede da empresa. Contudo, percebe-se que pese todos os esforços, a máquina é bastante emperrada e as empresas não estão conseguindo sequer ter resposta dos processos administrativos perante a Receita Federal, ou, excepcionalmente após longa espera. Toda essa burocracia atrasa sobremaneira os esforços para a construção de novos cinemas e para a digitalização do parque existente, o que além de ser uma medida ecológica, permitirá uma expansão ilimitada do acesso de cópias para as salas em todo o território. Além disso, permitirá a redução do custo de lançamento de filmes, beneficiando essencialmente os filmes brasileiros, em particular aqueles de menor apelo comercial. Enquanto o mundo todo digitaliza seu parque, o Brasil perde seu momento. Empreendedores imobiliários que ofertam espaços para salas de cinema não podem perder as datas de inauguração. O exibidor tem compromissos nos contratos de novos negócios, com datas certas, pesadas multas e obrigações. O apoio de distribuidores internacionais à digitalização não será eterno e cada dia que passa é um dia a menos. Em conclusão, esse pequeno exemplo para o país e grande problema para a exibição, confirma porque os prognósticos sobre o sucesso econômico do Brasil estão caindo rapidamente. O excesso de regulação e a pesada burocracia do Estado desestimulam investimentos. Os elevados custos tributários exigem políticas de desoneração setorial, sob pena de nada acontecer sem essa equalização de custos tributários. Os processos de desoneração são penosos, lentos e quando se efetivam, o momento passou. O exemplo dos percalços da aprovação do Recine mostra que nem mesmo quando o Estado quer ajudar, as coisas funcionam. Da idéia para o papel e do papel para a prática, perde-se a chance. A perda da chance é algo, às vezes, irrecuperável.