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AGICOA de olho no Brasil

Tela Viva - Glasberg

Organização internacional de produtores quer cobrar direitos sobre a exibição de obras na TV por assinatura no Brasil.

Agicoa (Association of International Collective Management of Audiovisual Works), entidade internacional sem fins lucrativos de gestão coletiva de direitos baseada na Suíça, está de olho no Brasil. Representantes da organização virão ao país no final de setembro com dois objetivos: fazer convênio com produtores nacionais para que recebam os direitos sobre suas obras exibidas na televisão em outros países e iniciar a cobrança de alegados direitos devidos pelas operadoras de TV por assinatura pela retransmissão de programas licenciados originalmente para a TV aberta.

O “cartão de visitas” da Agicoa são os estúdios da MPAA (Motion Pictures Association of America), a associação dos grandes estúdios norteamericanos, a quem a entidade representa, entre diversas outras sociedades de produtores, especialmente europeus, como a Associação dos Produtores Independentes da Grécia (Sapoe), a Federação  Internacional das Associações de Produtores de Filmes (FIAPF), baseada em Paris, ou a União de Produtores de Cine e Televisão (UPCT), da Espanha, entre vários outros, de 42 países.

Uma fonte conhecedora do mercado de cinema conta que no início, em idos de 1981, os grandes estúdios rejeitaram a proposta de uma sociedade independente gerindo seus direitos no exterior, mas mudaram de idéia quando os dólares começaram a fluir. O mesmo aconteceu com a Globo, que já recebeu direitos de retransmissão de seus programas em outros países através da Agicoa.

Na agenda da entidade no Brasil estão visitas a autoridades e empresas brasileiras e uma apresentação no Festival do Rio. Para os produtores nacionais, a Agicoa acena com a possibilidade de recebimento de direitos sobre obras exibidas nos países onde a entidade está presente.

Cobrança

O problema está na outra ponta. A Agicoa quer cobrar no Brasil o que chama de “direito de retransmissão (rebroadcast)”. Segundo a entidade, quando a TV por assinatura exibe a programação da TV aberta, isso gera um  novo direito aos produtores do conteúdo, ainda que esta retransmissão seja simultânea, como acontece no Brasil, e ainda que haja na lei brasileira a obrigatoriedade do must carry (carregamento dos canais abertos pela TV a cabo).  “São camadas diferentes de legislação”, conta o diretor legal da entidade, Helmut Koszuszeck. “O must carry é uma lei de mídia, de comunicação, não inclui os direitos de autor”, afirma.

Acontece que a lei brasileira não reconhece o direito autoral do produtor. Em carta enviada à entidade em 25 de julho, a ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura) explica que a Lei 9610 de 1998, em seu artigo 16, explicita que produtores não são co-autores das obras (apenas o autor do argumento e o diretor). A lei também não prevê a existência de direitos de produtores sobre a  exibição pública de obras audiovisuais, apenas de músicos e autores. Além disso, o Artigo 97 da mesma lei exige que qualquer cobrança coletiva de direitos seja feita apenas por entidade legalmente estabelecida no país.

Presente em 42 países, a Agicoa procura atuar agora no país, embora os direitos alegados não estejam na lei brasileira

Koszuszeck admite que o direito do produtor não é reconhecido no Brasil, mas diz que este direito é reconhecido em outros países, e que os produtores também recebem por direitos conexos. Ele diz ainda que o produtor muitas vezes adquire, por contrato, os direitos do diretor e do autor, para fazer a gestão destes direitos.

“Nos EUA e na Europa os produtores são protegidos como autores. Para os produtores anglo-saxões estes direitos valem, e o Brasil tem acordos que garantem que eles recebam aqui os mesmos direitos”, afirma Koszuszeck. No caso da Itália, ele diz, os produtores não são protegidos, como no Brasil. “Mas eles adquirem os direitos, e passam a ser protegidos”, resume.

A Ancine, agência que regula o audiovisual no Brasil, não havia sido procurada pela entidade até o fechamento desta edição. Para o Ministério da Cultura a Agicoa enviou uma correspondência em um tom “auto-promocional”, segundo o coordenador geral de direito autoral do ministério, Marcos de Souza.

“Eles só diziam que tem titulares com direitos a receber e nos deram um prazo para responder”. “Nosso entendimento é de que eles não têm o que recolher aqui.  Produtor não é autor e nem goza de direito conexo”, diz Souza. A posição é alinhada com a opinião do advogado especializado em direito autoral Marcos Bitelli, que afirma que não há base legal para a cobrança destes direitos alegados no Brasil. (AM)